quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

SOU AMIGO DA TETÊ, “A FADA DA ROCINHA”.

Matéria publicada na Revista Vogue de setembro, 2007.
De Eduardo Logullo com fotos de Murillo Meirelles

Cheguei muito atrasado para a consulta com meu dentista. Depois de alguns arranjos com as recepcionistas, ficou acertado um encaixe entre uma consulta e outra, na mesma noite. Ufa! Vou ser atendido. Mas a espera... Vamos lá. Paciência. É uma clínica enorme. Várias especialidades, muito movimento, pacientes espalhados por duas grandes salas envidraçadas como aquários. De imediato, tem-se uma imagem super bacana do lugar. Não dá para negar o quanto a odontologia evoluiu e se modernizou no Brasil e ao mesmo tempo, como seus benefícios clínicos e estéticos tornaram-se mais acessíveis ao cidadão comum num país de banguelas, como diriam os Titãs. Mas não é disso que eu quero falar. Normalmente levo meus próprios livros ou revistas para essas consultas porque, vamos combinar... Revista Caras? Ok. Sou meio enjoado, e daí? As revistas estão espalhadas sobre um balcão ao lado de uma TV de plasma que exibe apenas o logo da clínica em movimentos aleatórios num fundo preto. Particularmente, acho um desperdício de tanto plasma. Mas não tenho nada com isso. E ironicamente, acabo sentando de frente para a TV. Não há outros lugares. Um menino de uns 7 anos de idade tenta acertar o logotipo com a mão, dando tapas na tela como quem tenta aniquilar um mosquito imaginário. Calculo que o balcão deve ter uns 70cm de altura; mais a TV, outros 60cm, contando com a base, o que faz com que o menino dê pequenos pulos quando o logo se encontra na parte mais alta da tela. Cadê a mãe? Cadê o pai? Montes de caras enfiadas em Caras (a revista...trocadilho infame!). E nenhuma reação, nenhuma bronca. Os tapas continuam, agora mais violentos. Marcas de pequenas mãos, ora esquerda, ora direita, espalhadas por toda a tela. O monitor balança, indefeso, mas resiste. Deixando de lado o fato de que aquela caixa preta enorme pode despencar em cima do garoto, é até divertida a cena, nos primeiros três ou quatro minutos. Resolvo arriscar e pegar alguma coisa para ler. Para minha surpresa, encontro uma revista Vogue de setembro de 2007, vá lá, não tão antiga assim. Já vi coisas piores em consultas anteriores. Mas isso não vem ao caso. O fato é que meu amigo Ignácio de Loyola Brandão escreve para a Vogue e eu me delicio com seus artigos, em especial um em que fala das desilusões amorosas de mulheres como Lady Di, Maria Callas, Marilyn Monroe, Jackie Onassis (pós-Kennedy), Sylvia Plath, Tina Turner, entre outras. De repente, dei de cara com a Tetê, no meio da revista, modo de dizer. Não no mesmo artigo, é claro. Mas poderia. Será que o Loyola conhece a Tetê ? Provavelmente. Até sei, aqui entre nós, de alguém por quem Tetê foi apaixonada e hoje não é mais... Pode muito bem ter sido uma desilusão, como sempre é no final. Tetê foi namorada de João, que antes era namorado da Dani, quando nos conhecemos em Lisboa. Bons tempos aqueles. Lembro de uma ida nossa ao cinema para assistir a um Blake Edwards, com o já falecido John Ritter. Ana e eu estávamos meio separados na época. Ana aqui no Brasil e eu lá, chorando de saudades dela no cinema, ao ouvir Ivan Neville cantando “Falling out of love”, da trilha do filme. Isso porque o filme era uma comédia. João e Dani nem perceberam. E a música é linda, podem acreditar. Ana e eu reatamos meses mais tarde. Temos um filho lindo, Daniel, hoje com 14 anos. João e Dani, pouco depois daquela noite no cinema, voltaram ao Brasil e logo se separaram. Somos todos cariocas, menos a Ana que é paulista e o Daniel, que nasceu em Lisboa. Dani foi morar na Tijuca, João mudou-se para a Urca e foi quando conheceu e namorou Tetê, na mesma época em que voltávamos para São Paulo. Daniel era ainda um bebê, com a foto de corpo inteiro no seu passaporte, inesquecível. Foi quando a conheci. Tetê já era a “Fada da Rocinha”como bem a batizou Eduardo Logullo na matéria da Vogue. E a Tetê merece. Só para resumir, a história é assim: Tetê, além de socióloga, é educadora artística e levou a arte no início da década de 80, sob a forma de aulas e oficinas para crianças carentes da Favela da Rocinha, no Rio. Um dia, ganhou restos de tecidos de algumas confecções e as mães das crianças pediram para que não usassem aqueles panos com as crianças porque elas fariam alguma coisa melhor com eles. Foi então que nasceu uma das ações sociais mais importantes do Rio de Janeiro e, diga-se de passagem, sem qualquer apoio governamental. Estava criada a “Coopa-Roca” (Cooperativa de Trabalho Artesanal da Rocinha - http://www.coopa-roca.org.br/). As mães tinham um trabalho sem que precisassem sair da Rocinha e deixar seus filhos. No início faziam bordados, crochê, fuxicos e retalhos. Hoje a Coopa-Roca ganhou o mundo e tem parceiros como a M.Officer e Carlos Miele, Osklen e Lenny, Alexander McQueen e mais um monte de empresas, designers, artistas plásticos, e por aí vai. Ainda encontro com João regularmente, que hoje é namorado da Ana. Não a mesma Ana, lógico. Ela é carioca também, super gente boa. Ele de vez em quando vem a São Paulo e fica em nossa casa, dividindo o quarto com o Daniel que só faz uma exigência: Dormir na cama do alto da beliche. A Tetê eu não vejo a alguns anos mas vou dar um alô, ainda essa semana. Para comentar da matéria na Vogue e passar o link do meu blog que ela nem sabe que existe. Dizem que a pessoa fica com a orelha queimando, pegando fogo quando alguém fala dela. Se falar bem, é a direita. Tetê... pega o extintor de incêndio aí, mulher !




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